quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Mangue Negro




Desde que George Romero trouxe de volta à vida seus mortos e deu uma nova roupagem para eles no seu clássico A Noite dos Mortos Vivos, o mundo se viu invadido por uma grande leva de filmes, bons e ruins, que nunca foram tão famosos como hoje em dia. Prova disso é a popularidade crescente entre o publico, principalmente o jovem, que está disposto a consumir qualquer coisa que tenha zumbis no meio. Popularidade nunca foi sinônimo de qualidade, isso é fato. Mas é fato também que zumbis são uma das coisas mais legais que surgiram no cinema desde que o ser humano o inventou. Por isso, eu sempre me divirto assistindo e reassistindo clássicos do gênero.

Podemos dizer que esse é e sempre foi um fenômeno internacional, já que existem fãs em todas as partes do mundo e são realizadas produções em todas as partes do mundo também. Um exemplo disso é o filme que me levou a ser fã do gênero: uma produção italiana, o grande clássico Zombie  do mestre Lucio Fulci. Depois que vi aquele filme, descobri o que era um gore bem feito e entrei de cabeça nesse universo.

E aqui no Brasil também é algo popular, e também se faz filmes do gênero. O primeiro foi Zombio, de 1999, dirigido por Petter Baiestorf, que ganhou uma sequência recentemente. Outros exemplos são A capital dos Mortos, Porto dos Mortos e Desalmados, entre outros.

Mas o filme que será analisado agora é Mangue Negro, lançado em 2008 e dirigido por Rodrigo Aragão.

Já é um fato conhecido por todos que o capixaba Rodrigo Aragão virou o novo grande nome do undeground cinematográfico nacional com seus longas já lançados em vídeo e festivais nacionais e internacionais, como Mangue Negro, A Noite do Chupa-Cabras e Mar Negro. Hoje ele é sinônimo de qualidade para quem busca um bom filme de terror nacional.

Feito alguns curtas durante um tempo, o primeiro longa de Aragão foi o feroz ataque dos zumbis em Mangue Negro, que apesar de não ser o primeiro exemplo nacional sobre os monstros criados por George A. Romero, talvez seja hoje em dia, o mais famoso. Reconhecimento merecido, diga-se de passagem, já que não é apenas um filme nacional de zumbis, é um bom filme nacional de zumbis.

Com todo aquele clima e violência dos bons filmes de terror dos anos 70 e 80. Mangue Negro é uma boa pedida para quem está cansado de produções pífias ou nunca se aventurou pelo cinema de gênero no Brasil. Pode parecer estranho ver um filme de zumbis feito em nossas terras, mas acredite, o cinema nacional é muito mais que filmes de nordeste ou favela.

O filme é a clássica historia do ataque de zumbis a um grupo de azarados que tem que se virar para sobreviver num lugar cada vez mais claustrofóbico e hostil.  No caso aqui, um mangue, lugar de extrema dificuldade para filmar que é explorado de forma muito eficiente pela produção. As cenas dos zumbis putrefatos caminhando lentamente pela mata escura são de arrepiar pelo seu clima de tensão e medo. Ver zumbis caminhando por ruas de grandes cidades é legal, mas vê-los caminhando em um local afastado e desolado como esse é de causar mais pavor ainda.

A fórmula básica de um filme de horror, que mesmo sendo repetida aqui, é feita de forma que nos sentimos familiarizados com o filme e, ao mesmo tempo, surpresos pela sua qualidade. Pois mesmo vendo centenas de filmes de gênero, não é sempre que podemos ver a velha fórmula sendo realizada num ambiente cem por cento nacional.

Podemos ver isso também nos personagens, sejam eles os secundários ou principais, que são carismáticos e representam bem várias facetas do povão brasileiro. São gente como a gente mesmo, algo não típico no cinema de horror normal.

O mocinho da nossa obra é o tímido Luis, interpretado por Walderrama dos Santos; ele é apaixonado por Raquel, interpredada por Kika de Oliveira. O problema é que sempre que ele tenta se declarar algo acontece que o impede. Seja por um habitante mala do mangue, ou o ataque de um feroz zumbi.

A falta de jeito do nosso herói para se declarar para a mocinha pode deixar muitas pessoas nervosas; eu mesmo ficava puto cada vez em que ele estava prestes a falar o que sente e algo atrapalhava. Mas ao mesmo tempo, acompanhamos como ele torna-se o herói do local e vira um exímio matador de zumbis com sua machadinha.

Eu sempre gostei do personagem “loser” se tornando o herói; em outras palavras, quando o fracassado local torna-se o único que pode combater e sobreviver uma ameaça terrível. Impossível não compará-lo ao personagem Ash, de Evil Dead, interpretado por Bruce Campbell, afinal, os dois são a pessoa que você jura que morreria primeiro, mas acabam se tornando os grandes heróis dos filmes.

O interessante do herói desse filme é que, mesmo que ele se torne um exímio matador de zumbis, ainda podemos ver seu lado humano, sua coragem de enfrentar os monstros e perigos que aparecem no mangue, mas, ao mesmo tempo, com medo de perder a mulher que ama. E eu adoro ver isso, um personagem que mesmo enfrentando terríveis monstros, ainda é uma pessoa normal, que sente medo, dor, não tem jeito com as mulheres. Ou seja, o típico cara que você acaba adorando ao final do filme.

E destaque também para o melhor personagem do longa: Agenor dos Santos, interpretado de forma carismática por Markus Konká; ele que introduz o filme, e sua presença e carisma são algo muito bom de se ver na tela. Todas as partes em que ele está em cena, podemos ver é um bom ator e que merece mais espaço nas produções nacionais.

A violência gráfica, o chamado gore, é algo lindo de se ver. Quem é fã de ver um bom sangue cenográfico saindo a litros vai ficar feliz. Rodrigo Aragão, além de dirigir, fez a maquiagem e efeitos do filme, dominando as técnicas com maestria. Como fã de coisas feitas estilo old-school, digo que é muito melhor ver efeitos práticos feitos na mão, ou seja, feitos na raça. Algo que deixa a violência muito mais realista e “bonita” de se ver do que colocando toneladas de CGI.

A direção é ágil e dinâmica. Sabendo quando e onde mover a câmera, deixando as cenas de terror e ação muito bem feitas. Mas também sabe a hora que precisa respirar e retomar fôlego, com momentos mais climáticos, mas sem perder o pique. Acredite, quando o clima começa a esquentar, pode ter certeza que verá cenas de puro terror misturadas com uma ação sem exageros, algo muito bem feito.

Por último, vou falar que o trabalho que fizeram no DVD é algo maravilhoso; além de inúmeros extras, a embalagem vem com uma bonita luva, encarte e cards do filme. Agora me pergunto se uma produção nacional independente tem um acabamento profissional do jeito que colecionadores como eu procuram, o que fazem as grandes distribuidoras que nos lançam edições cada vez mais vagabundas?


Isso é tudo por hoje, o que tenho para dizer é: vá e assista! Seja pela curiosidade de ver um filme nacional de terror (um tabu para muita gente hoje em dia), ou ainda fãs de zumbis que vão descobrir que o Brasil pode dar o melhor do gênero.



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