Desde que George Romero trouxe de
volta à vida seus mortos e deu uma nova roupagem para eles no seu clássico A Noite dos Mortos Vivos, o mundo se viu
invadido por uma grande leva de filmes, bons e ruins, que nunca foram tão
famosos como hoje em dia. Prova disso é a popularidade crescente entre o
publico, principalmente o jovem, que está disposto a consumir qualquer coisa
que tenha zumbis no meio. Popularidade nunca foi sinônimo de qualidade, isso é
fato. Mas é fato também que zumbis são uma das coisas mais legais que surgiram
no cinema desde que o ser humano o inventou. Por isso, eu sempre me divirto
assistindo e reassistindo clássicos do gênero.
Podemos dizer que esse é e sempre
foi um fenômeno internacional, já que existem fãs em todas as partes do mundo e
são realizadas produções em todas as partes do mundo também. Um exemplo disso é
o filme que me levou a ser fã do gênero: uma produção italiana, o grande
clássico Zombie do mestre Lucio Fulci. Depois que vi aquele
filme, descobri o que era um gore bem feito e entrei de cabeça nesse universo.
E aqui no Brasil também é algo
popular, e também se faz filmes do gênero. O primeiro foi Zombio, de 1999, dirigido por Petter Baiestorf, que ganhou uma sequência
recentemente. Outros exemplos são A capital
dos Mortos, Porto dos Mortos e Desalmados, entre outros.
Mas o filme que será analisado
agora é Mangue Negro, lançado em 2008
e dirigido por Rodrigo Aragão.
Já é um fato conhecido por todos
que o capixaba Rodrigo Aragão virou o novo grande nome do undeground
cinematográfico nacional com seus longas já lançados em vídeo e festivais
nacionais e internacionais, como Mangue
Negro, A Noite do Chupa-Cabras e Mar Negro. Hoje ele é sinônimo de
qualidade para quem busca um bom filme de terror nacional.
Feito alguns curtas durante um tempo,
o primeiro longa de Aragão foi o feroz ataque dos zumbis em Mangue Negro, que apesar de não ser o
primeiro exemplo nacional sobre os monstros criados por George A. Romero,
talvez seja hoje em dia, o mais famoso. Reconhecimento merecido, diga-se de
passagem, já que não é apenas um filme nacional de zumbis, é um bom filme
nacional de zumbis.
Com todo aquele clima e violência
dos bons filmes de terror dos anos 70 e 80. Mangue
Negro é uma boa pedida para quem está cansado de produções pífias ou nunca
se aventurou pelo cinema de gênero no Brasil. Pode parecer estranho ver um
filme de zumbis feito em nossas terras, mas acredite, o cinema nacional é muito
mais que filmes de nordeste ou favela.
O filme é a clássica historia do
ataque de zumbis a um grupo de azarados que tem que se virar para sobreviver
num lugar cada vez mais claustrofóbico e hostil. No caso aqui, um mangue, lugar de extrema
dificuldade para filmar que é explorado de forma muito eficiente pela produção.
As cenas dos zumbis putrefatos caminhando lentamente pela mata escura são de
arrepiar pelo seu clima de tensão e medo. Ver zumbis caminhando por ruas de
grandes cidades é legal, mas vê-los caminhando em um local afastado e desolado
como esse é de causar mais pavor ainda.
A fórmula básica de um filme de
horror, que mesmo sendo repetida aqui, é feita de forma que nos sentimos
familiarizados com o filme e, ao mesmo tempo, surpresos pela sua qualidade.
Pois mesmo vendo centenas de filmes de gênero, não é sempre que podemos ver a
velha fórmula sendo realizada num ambiente cem por cento nacional.
Podemos ver isso também nos
personagens, sejam eles os secundários ou principais, que são carismáticos e
representam bem várias facetas do povão brasileiro. São gente como a gente
mesmo, algo não típico no cinema de horror normal.
O mocinho da nossa obra é o tímido
Luis, interpretado por Walderrama dos Santos; ele é apaixonado por Raquel,
interpredada por Kika de Oliveira. O problema é que sempre que ele tenta se
declarar algo acontece que o impede. Seja por um habitante mala do mangue, ou o
ataque de um feroz zumbi.
A falta de jeito do nosso herói
para se declarar para a mocinha pode deixar muitas pessoas nervosas; eu mesmo
ficava puto cada vez em que ele estava prestes a falar o que sente e algo
atrapalhava. Mas ao mesmo tempo, acompanhamos como ele torna-se o herói do
local e vira um exímio matador de zumbis com sua machadinha.
Eu sempre gostei do personagem “loser”
se tornando o herói; em outras palavras, quando o fracassado local torna-se o
único que pode combater e sobreviver uma ameaça terrível. Impossível não compará-lo
ao personagem Ash, de Evil Dead,
interpretado por Bruce Campbell, afinal, os dois são a pessoa que você jura que
morreria primeiro, mas acabam se tornando os grandes heróis dos filmes.
O interessante do herói desse filme
é que, mesmo que ele se torne um exímio matador de zumbis, ainda podemos ver seu
lado humano, sua coragem de enfrentar os monstros e perigos que aparecem no
mangue, mas, ao mesmo tempo, com medo de perder a mulher que ama. E eu adoro
ver isso, um personagem que mesmo enfrentando terríveis monstros, ainda é uma
pessoa normal, que sente medo, dor, não tem jeito com as mulheres. Ou seja, o
típico cara que você acaba adorando ao final do filme.
E destaque também para o melhor
personagem do longa: Agenor dos Santos, interpretado de forma carismática por
Markus Konká; ele que introduz o filme, e sua presença e carisma são algo muito
bom de se ver na tela. Todas as partes em que ele está em cena, podemos ver é
um bom ator e que merece mais espaço nas produções nacionais.
A violência gráfica, o chamado
gore, é algo lindo de se ver. Quem é fã de ver um bom sangue cenográfico saindo
a litros vai ficar feliz. Rodrigo Aragão, além de dirigir, fez a maquiagem e
efeitos do filme, dominando as técnicas com maestria. Como fã de coisas feitas
estilo old-school, digo que é muito melhor ver efeitos práticos feitos na mão,
ou seja, feitos na raça. Algo que deixa a violência muito mais realista e “bonita”
de se ver do que colocando toneladas de CGI.
A direção é ágil e dinâmica.
Sabendo quando e onde mover a câmera, deixando as cenas de terror e ação muito
bem feitas. Mas também sabe a hora que precisa respirar e retomar fôlego, com
momentos mais climáticos, mas sem perder o pique. Acredite, quando o clima
começa a esquentar, pode ter certeza que verá cenas de puro terror misturadas
com uma ação sem exageros, algo muito bem feito.
Por último, vou falar que o
trabalho que fizeram no DVD é algo maravilhoso; além de inúmeros extras, a
embalagem vem com uma bonita luva, encarte e cards do filme. Agora me pergunto
se uma produção nacional independente tem um acabamento profissional do jeito
que colecionadores como eu procuram, o que fazem as grandes distribuidoras que nos
lançam edições cada vez mais vagabundas?
Isso é tudo por hoje, o que tenho
para dizer é: vá e assista! Seja pela curiosidade de ver um filme nacional de
terror (um tabu para muita gente hoje em dia), ou ainda fãs de zumbis que vão
descobrir que o Brasil pode dar o melhor do gênero.
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